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IA e a construção de um novo modelo industrial no Brasil

IA

“Quando acompanhamos o cenário macro das tendências tecnológicas, não é difícil perceber o quanto a IA (inteligência artificial) tem sido uma força propulsora de soluções em diferentes segmentos econômicos. 

Pensando em termos de valor de mercado, o mercado de inteligência artificial deve alcançar um crescimento médio, até 2025, superior a 36%, partindo de US$ 16 bilhões em 2017 para US$ 190,6 bilhões ao fim do período.

Os números são de estudo da consultoria Markets and Markets e indicam, sobretudo, o quanto esta tecnologia ainda pode evoluir e se consolidar no ambiente de negócios contemporâneo. 

Tendo em vista o potencial deste mercado, é interessante observar quais os segmentos que mais têm direcionado esforços para a aplicação de inteligência artificial.

Em relatório divulgado em 2019 pela IDC, a liderança dos investimentos em soluções de IA é do varejo, seguido dos bancos, indústria e dos provedores de saúde. Por sua vez, um levantamento da Allied Market Research destaca as indústrias automotiva, de transportes, de healthcare e de agro (em conjunto com outras verticais como varejo, marketing e TI), como os principais eixos de investimentos do mercado de inteligência artificial no mundo dentro do período de 2018 a 2025

IA como possível tendência

Diante deste contexto, em que o segmento industrial, em suas mais diversas verticais, aparece como um dos líderes na jornada de investimentos em inteligência artificial no mundo, é fundamental analisarmos até que ponto esta tendência pode vir a se fortalecer no Brasil e a se tornar uma das principais bases do modelo de indústria 4.0 nacional.

Para o sócio e diretor comercial na Aquarius Software e professor do curso de Indústria 4.0 na Fundação Vanzolini, Carlos Paiola, a inteligência artificial deve assumir um papel decisivo no desenvolvimento industrial ao longo dos próximos anos e na própria consolidação dos conceitos de indústria 4.0 no Brasil.

“O mercado de IA é chave para o desenvolvimento industrial ao longo dos próximos anos. Algumas pessoas podem argumentar que a inteligência artificial vem da década de 50, que não é algo novo. Eles têm razão. O que não estão levando em conta, no entanto, é a incrível evolução computacional que tivemos nos últimos anos, com hardwares cada vez menores, mais potentes e de menor custo, aliados ao IoT e à gigantesca quantidade de dados disponíveis que, até pouco tempo atrás, era inviável de ser coletada, processada e armazenada no volume necessário para trazer resultados confiáveis e rápidos na aplicação de algoritmos de IA”, explica Paiola.

Sinais positivos

E o ambiente de negócios brasileiro começa a dar alguns sinais positivos na direção dos investimentos em inteligência artificial.

Segundo dados do Sebrae divulgados pela ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), foram projetados gastos de US$ 182 milhões em soluções de IA só em 2018, além disso, apenas para efeito de contextualização, o Brasil é o segundo país que mais utiliza o Watson, plataforma de inteligência artificial e serviços cognitivos da IBM, de acordo com reportagem da própria IBM divulgada no Canaltech e a própria IBM anunciou investimentos de R$ 20 milhões no Brasil para a criação de um centro de inteligência artificial, em conjunto com a FAPESP (Fundação de amparo à pesquisa do estado de São Paulo). 

Apesar disso, ainda há muito espaço para expansão das soluções de IA na indústria brasileira.

Uma pesquisa da CNI divulgada no portal Investimentos & Notícias revelou, por exemplo, que 42% das empresas desconhece o potencial para o aumento de sua competitividade, ao passo que, no momento, somente 17% dos entrevistados declarou ter como prioridade os investimentos em sistemas inteligentes de gestão e inteligência artificial.

Um dos possíveis fatores para este cenário, como já frisado por especialistas ao longo deste estudo, consiste na necessidade de formação e de um aprofundamento, por parte dos gestores de fábricas e dos líderes atuantes na indústria nacional, nas novas demandas da indústria 4.0.

 

Aplicações de IA

Neste sentido, é importante esclarecermos, dentre outros pontos, quais as possíveis aplicações de IA e os respectivos benefícios que tais tecnologias podem trazer para o segmento industrial e para o fortalecimento da indústria 4.0 no Brasil.

O próprio artigo do portal Investimentos & Notícias, citado no parágrafo anterior, destaca aplicações de IA na manutenção preditiva – fornecendo, por exemplo, avisos automatizados para os gestores antes da quebra de uma máquina –, na integração com o trabalho humano e na otimização de rotas e agendamento de serviços técnicos.

Já a TOTVS, em artigo para o seu blog corporativo, destaca como a inteligência artificial pode ser utilizada em processos de simulação, por meio de integrações com IoT, além de ser fundamental na robotização, aprendizado de máquinas e na já citada manutenção preditiva.

Robotização e Manutenção Preditiva

Carlos Paiola reforça a utilização da inteligência artificial no âmbito da manutenção preditiva de plantas industriais.

“Um ótimo exemplo de aplicação industrial de IA é o uso de machine learning para a manutenção preditiva dos principais ativos de uma planta. Baseado em dados históricos de processo, o algoritmo permite a criação de um modelo virtual – uma espécie de gêmeo digital (Digital Twin) – do equipamento, que é comparado em tempo real com as informações obtidas diretamente dos sensores instalados nele. Quando há a verificação de uma tendência ou “assinatura” que leve a uma futura falha prevista pelo modelo, o sistema gera um alarme que leva a equipe de manutenção de maneira antecipada à correção do desvio”, conclui o sócio e diretor comercial na Aquarius Software e professor da Fundação Vanzolini.

Sobre os processos de robotização, aliás, merece destaque o fato de que o Brasil conta com nove robôs para cada 10 mil trabalhadores nas fábricas, segundo dados da Federação Internacional de Robótica (IFR – na sigla internacional).

Embora o número ainda seja pequeno quando comparado com outras grandes economias (a Coreia do Sul, líder desse ranking, conta com 437 robôs para cada 10 mil trabalhadores), o movimento de robotização vem aumentando no país. Ainda segundo a pesquisa, em 2019, o Brasil deve fechar o ano com mais 3,5 mil robôs industriais – mais que o dobro dos 1,4 mil adquiridos em 2015, por exemplo.

Os desafios de adaptação

Diante deste cenário e da evolução tecnológica do mercado, há uma preocupação natural dos trabalhadores quanto a substituição da mão de obra humana por soluções de IA e máquinas mais eficientes. Todavia, estudos recentes indicam que, na verdade, o que está em curso é uma nova dinâmica do mercado de trabalho impulsionada pela inteligência artificial que exige adaptações, mas abre, também, novas oportunidades.

Para a Gartner, por exemplo, ao passo que postos de trabalho mais operacionais vão ser substituídos, outras funções vão ser criadas e exigirão do trabalhador do futuro habilidades de interpretação, análise e os chamados soft skills.

De acordo com dados recentes da consultoria, enquanto 1,8 milhão de vagas devem ser substituídas por IA e novas tecnologias a partir de 2020, outras 2,3 milhões serão criadas graças, justamente, ao movimento de transformação do ambiente de negócios global.

Benefícios da Inteligência Artificial

E os benefícios que podem ser extraídos da inteligência artificial, na percepção de lideranças do mercado, são significativos.

Uma pesquisa da Cognizant com empresas dos Estados Unidos e da Europa aponta, por exemplo, que 45% das organizações com crescimento acima da média em seus segmentos ligam a inteligência artificial, diretamente, ao sucesso de seus negócios, enquanto 33% preveem maior eficiência e redução de custos graças a IA.

Uma matéria da Forbes de 2017, por sua vez, aponta que 84% dos entrevistados acredita que a inteligência artificial pode trazer ou fortalecer diferenciais competitivos em relação a concorrência, enquanto um levantamento da Business Wire indica que, para 80% dos gestores e líderes de tecnologia, a IA vai contribuir para um aumento de produtividade e para a criação de novos empregos

Tendo em vista esta percepção do mercado, muitas oportunidades se abrem para startups que trabalham com IA. No Brasil, a MVISIA utiliza inteligência artificial para desenvolver câmeras inteligentes focadas no controle de processos industriais. 

“Inteligência Artificial, IoT e data analytics fazem parte de nossa infraestrutura tecnológica. De modo simplificado, a gente desenvolveu uma câmera com um computador acoplado que roda algoritmos de inteligência artificial para que a câmera possa aprender a controlar um determinado processo na indústria. Ela funciona como um inspetor robótico que acompanha a linha de produção. Caso haja algum problema, a câmera se comunica com o controlador central, podendo travar a esteira ou emitir um alerta sonoro, dando, enfim, um indicativo do problema”, comenta Fernando Velloso, diretor comercial da MVISIA. 

Oportunidades e questões que devem ser superadas pelas startups

Dentro deste cenário de oportunidades geradas pela indústria 4.0, no entanto, as startups precisam ficar atentas a alguns desafios que envolvem desde o processo de transformação pelo qual o setor industrial está passando até o desafio de imersão tecnológica das lideranças, que já frisamos anteriormente.

Além disso, um artigo da Grove Ventures, venture capital de Israel focada em negócios de tecnologia em fase inicial, aponta algumas questões importantes para as startups que desejam se fortalecer dentro da janela de oportunidades gerada pela indústria 4.0, como a capacidade de focar nos problemas de um segmento específico, além da necessidade de se preparar para longos ciclos de vendas.

Outro ponto importante para o qual as startups têm de se atentar é a capacidade de atender aos níveis de segurança da informação exigidos pelas grandes empresas.

Segundo uma pesquisa da Accenture, por exemplo, 80% das organizações têm investidos em inovações digitais para se prevenir de ataques cibernéticos, ao passo que, para 68% dos líderes empresariais consultados no levantamento, o risco de tais ataques está crescendo ao longo dos últimos anos.

Neste sentido, entrevistados consultados para o presente estudo, apontaram que, graças a este cenário, grandes empresas têm níveis de segurança muito elevados, e, nem sempre, as startups conseguem se adequar a este contexto de cybersecurity.  

A opinião de especialistas

Fernando Velloso, por sua vez, aponta a necessidade de um maior entendimento, por parte das startups, da realidade da indústria brasileira e seus desafios de digitalização, sobretudo para que estas empresas sejam capazes de lidar com um ambiente de inovação que, muitas vezes, se encontra em estágio inicial.

“Neste sentido, em muitos casos, essas startups esbarram em problemas muito simples que ainda nem sempre estão sanados na indústria do país – problemas de conectividade, acesso à rede, acesso a dados, intercomunicação entre máquinas, padrões de comunicação, dentre outros desafios”, analisa o diretor comercial da MVISIA.

Finalmente, sobre a questão dos ciclos de venda destacado pela Grove Ventures mais acima, Vitor Tosetto, CEO da Pix Force, startup que fornece soluções de interpretação de imagens baseadas em visão computacional, IA e machine learning, ressalta que “um grande desafio para as startups é suportar o tempo dos processos de contratação de grandes indústrias. Normalmente nosso ciclo de venda tem em torno de 3 meses. Todo este ciclo é sacrificante para o fluxo de caixa de qualquer startup. Na minha opinião, para lidar com startups, as empresas precisam ser mais ágeis durante o processo de contratação”. 

Apesar de todos os desafios listados aqui, Tosetto acredita que a indústria brasileira está passando por um processo, cada vez maior, de abertura para a inovação.

É nítida a evolução da indústria brasileira em busca de novas tecnologias. O indicador claro desta tendência é a quantidade de startups e novas oportunidades que vimos surgir ao longo deste ano. As grandes empresas estão cada vez mais abertas a escutar o que temos para oferecer”, conclui.

Saiba o que os profissionais de grandes empresas e especialistas estão falando sobre o tema em entrevistas completas aqui

Hekima

A Hekima é uma startup que une mineração de dados, computação cognitiva e inteligência artificial para melhorar a tomada de decisões nas empresas. Atua em diferentes indústrias e conta com clientes como Gerdau, Vallourec e Saint-Gobain. Recentemente, foi adquirida pelo iFood.

Autaza

Em sua infraestrutura tecnológica, a Autaza combina inteligência artificial e visão computacional para processos de inspeção de qualidade na indústria. Em maio de 2019, recebeu investimentos do Fundo Primatec e conta com clientes como GM, Embraer e Opel.

Curiosity

Fundada em 2018, a Curiosity é uma startup alemã especializada em auxiliar indústrias, por meio de inteligência artificial, a transformar documentos não-estruturados em informação relevante para os seus processos de manufatura. Participa do Programa Insurtech Europe Program da Plug & Play. 

Sentian

A startup sueca fundada em 2016, Sentian, utiliza AI e machine learning para detectar falhas em equipamentos e realizar manutenções preditivas em grandes indústrias. A startup é uma das finalistas do Nordic Startup Awards de 2019, nas categorias “Melhor Startup do Ano” e “Melhor Startup de AI”.