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A necessidade de um consumo consciente para combate ao desperdício

Ligada de forma direta à consciência de consumo está a necessidade de diminuir e mitigar ao máximo o desperdício de alimentos em todo o mundo

Ligada diretamente ao consumo consciente e desenvolvimento sustentável está a questão do desperdício e a necessidade de contê-lo, de forma que os alimentos como um todo sejam melhor aproveitados e direcionados. Isso porque para a produção dos alimentos, há uma grande quantidade de recursos utilizados – água, energia, embalagens – cuja parte da utilidade, no fim das contas, também é jogada fora.

Uma necessidade de reversão do cenário

Em dados absolutos, os números relacionados ao desperdício são surpreendentemente negativos. De acordo com informações da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), 1.3 bilhão de toneladas de alimentos é desperdiçada ou perdida anualmente entre a cadeia de produção.

Esse volume representa ⅓ do total produzido em todo o planeta. Conforme informações publicadas no Nexo, apenas 25% do que é descartado seria suficiente para suprir as necessidades da população com fome. Ainda segundo o órgão internacional, o desperdício é responsável por 46% da comida que vai para o lixo, enquanto que as perdas correspondem aos outros 54%.

De acordo com afirmação do pesquisador Antonio Gomes Soares (Embrapa Agroindústria de Alimentos – Rio de Janeiro, RJ), durante uma palestra no 8º Fórum Mundial da Água, esse volume acaba representando, também, um desperdício de 170 trilhões de litros de água por ano, além de outras consequências.

“É importante salientar que desperdiçar alimentos é jogar dinheiro fora. Mas, mais importante que isso é a falta de conscientização com as pessoas que não têm acesso ao alimento no Brasil e no mundo. Ao desperdiçar alimentos ou aumentar as perdas de alimentos durante a cadeia de produção, comercialização e consumo, aumenta também a emissão adicional de gases de efeito estufa, uma vez que grande parte desse desperdício é jogada em aterros sanitários”, declarou o pesquisador em sua palestra.

A “contribuição” do Food Service para o desperdício no Brasil

Globalmente, uma parte da cadeia responsável por parte do desperdício em massa de alimentos são os restaurantes, o que acarreta em prejuízo para os estabelecimentos além, claro, das questões sociais de combate à fome. Segundo informações do World Resources Institute (WRI) Brasil publicadas no portal Terra, o desperdício de alimentos no Brasil soma mais de 41 mil toneladas, sendo 15% dessas em restaurantes, aproximadamente seis mil toneladas.

Além disso, ainda conforme o instituto, 9,55% da comida preparada em estabelecimentos de fast food é jogada fora, índice que chega a 11,3% em restaurantes que oferecem todo o serviço.

Um dos grandes problemas e desafios nisso tudo é que não existem soluções 100% certeiras para resolver os problemas e todas as recomendações, apesar de coerentes, são pouco imperativas e não têm resultado em grandes mudanças no cenário. No entanto, aos poucos nascem iniciativas, muitas delas ligadas à tecnologia, que buscam mudar esse panorama.

Soluções tecnológicas para o combater o problema

É o caso da Too Good to Go, iniciativa dinamarquesa que reaproveita alimentos em boas condições que seriam descartados – que não participaram da montagem de um prato, por exemplo – por restaurantes, estabelecimentos, hotéis, buffets, padarias e outros, comercializando-os com consumidores por meio de um aplicativo. Para os usuários representa um modo sustentável de alimentação, por preços mais baratos, enquanto que para a outra ponta significa uma renda extra, visto que os alimentos seriam jogados fora.

O serviço, presente em países escandinavos e no Reino Unido, distribuiu mais de 510 mil novas refeições, evitando a emissão de aproximadamente mil toneladas de dióxido de carbono no ambiente. O Too Good To Go conta com uma comunidade com número superior a 570 mil usuários e 1560 estabelecimentos cadastrados.

No Brasil, a Desperdício Zero é uma startup que conecta o varejo com o consumidor final, em uma plataforma que disponibiliza produtos perto da data de validade, mas ainda em boas condições de consumo, por preços até 75% mais baixos. Assim, de um lado supermercados e outros estabelecimentos registram as ofertas e, do outro, consumidores selecionam conforme a demanda, por localização e categoria de produto.

A criação de iniciativas como essas, além da importância que possuem por conta do seu objetivo principal, também é importante para uma maior conscientização da população a respeito do grande problema e desafio que a questão do desperdício representa.

Brasil entre os países que mais desperdiçam comida no mundo

De acordo com um levantamento feito pela Unilever em 2017, apoiado pela Organização das Nações Unidas, 61% dos brasileiros descartam um ou dois alimentos em perfeito estado, por semana. E aproximadamente metade (49%) faz isso diariamente. Tais índices colocam o Brasil entre os dez países que mais desperdiçam comida no mundo, com uma média de 41,6 quilos descartados por cada brasileiro no ano.

Arte com informações sobre o descarte de alimentos em bom estado.

Em relação aos supermercados, os números também espantam: em 2016, houve uma perda de R$ 7,11 bilhões em faturamento desses estabelecimentos por conta de desperdício de alimentos, segundo dados da Abras (Associação Brasileira de Supermercados). A startup Food Finder nasceu a partir de uma percepção de que havia (como há, de fato) um desperdício exagerado por parte da indústria e do varejo alimentar.

Atualmente, disponibiliza uma plataforma para que essa ponta se conecte com a outra dentro da cadeia de Food Service, possibilitando que restaurantes, bares e padarias comprem produtos próximos da data de validade em bom estado, que seriam jogados fora, por preços mais baixos. Além disso, também conecta partes interessadas na doação de alimentos, normalmente direcionada a Food Banks e ONGs, sem cobrança.

Iniciativas em direção ao consumo consciente

Dentre as categorias de alimentos, os mais desperdiçados são os perecíveis, como saladas (74%), vegetais (73%) e frutas (73%), ainda segundo o estudo da Unilever. No momento de descarte, os principais aspectos levados em consideração pelos brasileiros são aparência, para 85% dos entrevistados e prazo de validade expirado (83%).

Uma iniciativa brasileira que busca mitigar o desperdício de alimentos FLV (frutas, legumes e verduras) por conta da aparência é a Fruta Imperfeita, fundada em 2015, em São Paulo. De acordo com informações no site da própria empresa, 10% da produção total de frutas e legumes não se encaixa nos padrões estéticos exigidos pelo varejo, seja em relação ao tamanho, formato ou cor, e acabam sendo descartados. Segundo Roberto Matsuda, Fundador e CEO da startup, era necessário que, antes de qualquer outro posicionamento, a empresa fosse um movimento de consumo consciente e combate ao desperdício de alimentos.

“Nós queríamos empreender, mas de forma que pudéssemos fazer bem à cadeia como um todo, sem pensar unicamente no lucro. Após algumas análises e pesquisas sobre o segmento, percebemos que os pequenos produtores rurais precisavam de mais ajuda e suporte, porque existem dificuldades para eles acessarem o mercado. E, a partir disso, percebemos o problema da padronização estética dos produtos, e o pequeno produtor, sem opções, acaba por desperdiçar os alimentos considerados feios. Assim, com a nossa solução, conseguimos gerar mais renda para esse elo da cadeia”, conta Matsuda.

Hoje em dia, a Fruta Imperfeita atua como delivery de produtos FLV, entregues em cestas de diferentes tamanhos, conforme o desejo do consumidor. Em seus três anos de existência, a startup cresceu 100% a cada ano, possui uma base de 1500 assinantes recorrentes e salvou mais de 600 toneladas de alimentos que seriam jogados fora.

Para Matsuda, os novos hábitos dos consumidores ajudaram a alavancar a empresa, em um contexto de consumo mais consciente e alimentação saudável, mas ainda existe um desafio de atingir uma maior parte da população e de convencimento sobre os “produtos imperfeitos”.

“Nossos clientes veem o valor da sustentabilidade da Fruta Imperfeita, eles entendem e valorizam o movimento. Simultaneamente, existe essa preocupação, por parte das pessoas, de atenção em relação à procedência do produto, a tendência e desejo de comprar do pequeno produtor, do artesanal, do natural. Isso é muito forte na geração mais jovem com poder de consumo. No entanto, claramente ainda é um mercado mais nichado, principalmente na questão etária e de classe social, apesar dos preços competitivos. Então existe esse desafio de chegar em um número maior de pessoas, ser lucrativo também e convencer os consumidores de que os alimentos feios são tão bons quanto os outros”, finaliza ele.

Saiba o que os profissionais de grandes empresas e especialistas estão falando sobre o tema em entrevistas completas aqui

ndays

A Ndays, marketplace de compra e venda de produtos perecíveis cuja data de validade está próxima com descontos de até 70%, conecta a indústria ao varejo e ao consumidor final, que pode receber os produtos desejados por serviços de entrega.

comida invisível

O aplicativo Comida Invisível conecta restaurantes, hotéis, buffets, bares e varejo com ONGs, com o objetivo de facilitar a doação de alimentos que seriam descartados. O serviço se utiliza de geolocalização para otimizar as doações.

too good to go

A Too Good to Go é uma startup dinamarquesa que reaproveita alimentos em boas condições, mas que seriam descartados por restaurantes estabelecimentos, hotéis e outros, comercializando-os com consumidores por meio de um aplicativo. Já recebeu investimentos de € 6 milhões.

whywaste

A startup sueca Whywaste desenvolveu um sistema data-driven que ajuda o varejo a identificar alimentos cuja data de validade está próxima, possibilitando que sejam processados, utilizados ou doados, em vez de descartados. Já recebeu aproximadamente R$ 3,7 milhões em investimentos.

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