Quais os limites para o desenvolvimento físico, técnico e psicológico de uma atleta? Se, por um lado, a resposta para essa questão pode envolver desde pressupostos biológicos e científicos até discussões sobre ética e a filosofia esportiva, por outro, estamos diante de uma pergunta que tem motivado a evolução de novas tecnologias, suplementos e de todo um arsenal de técnicas a que um atleta de alto-nível pode recorrer para dar sempre um passo adiante em termos de performance.
Dentro deste contexto, o Estadão publicou, em novembro de 2017, uma reportagem sobre os chamados superatletas, competidores que, unindo treinamentos específicos e ingestão de suplementos têm conseguido não só quebrar recordes em suas respectivas modalidades, mas também continuar competindo em alto nível por períodos maiores de tempo. A matéria cita o exemplo de Cristiano Ronaldo, que, à época, tinha acabado de ser eleito o melhor jogador do mundo pela quinta vez e que, além da rotina de treinamentos, se submetia a um tratamento de DNA para a perda de um quilo de peso corporal por temporada com foco em manter a forma física.
Para o fisiologista Turíbio Leite de Barros, em entrevista recente, a formação de um competidor de elite envolve tanto questões físicas, orgânicas e genéticas, quanto o suplementação alimentar aliada aos treinos. Barros ressalta que “antigamente, era mais importante ter talento para se tornar um craque no futebol. Hoje, além do talento, é preciso ser um atleta”.
Novas tecnologias para o aumento da performance
E, neste cenário de busca pela superação de limites e obtenção do máximo que um atleta pode oferecer em termos de performance, startups e pesquisadores têm encontrado um terreno amplo para o desenvolvimento de novas tecnologias e perspectivas que podem transformar, de modo considerável, as rotinas de treinamento de um atleta.No campo de hard sciences, por exemplo, novas pesquisas têm sido desenvolvidas com base no DNA e estudos de variação de genoma, tendo em vista o auxílio para que competidores sejam capazes de superar seus limites.
Na UNIFESP, por exemplo, o biólogo molecular e professor João Bosco Pesquero coordena o projeto Atletas do Futuro, cuja uma das frentes visa, conforme explica reportagem da revista Entreteses, da UNIFESP, “criar um mapa genético dos atletas de elite de diferentes modalidades, avaliar o impacto desses marcadores ligados à aptidão física e usar essas informações como ferramenta confiável para orientar o tipo e a intensidade dos treinos, evitando lesões”.
Nas palavras do professor Bosquero, ao identificar marcadores genéticos, os pesquisadores acreditam, que “é possível saber se a pessoa tem maior predisposição às atividades de resistência, velocidade ou explosão”. Estas pesquisas, por sua vez, podem abrir espaço para que no futuro se desenhem novas tecnologias diretamente adaptadas ao mapeamento genético dos atletas.
E por falar em tecnologia voltada para performance, um mercado com potencial de crescimento envolve as roupas para alta performance que, em 2018, movimentaram US$ 6,1 bilhões. Segundo a Market Watch, este segmento deve alcançar um crescimento médio de 9,5% ao longo dos próximos anos.
Dados de mercado
Pensadas, em princípio, para atletas de elite, as vestimentas de alta performance vem sendo incorporadas por atletas amadores que desejam melhorar seus desempenhos no dia a dia, conforme ressalta conteúdo da revista Boa Forma. É o caso, por exemplo, dos maiôs fastskin, utilizados por nadadores e que diminuem a resistência da água sobre o corpo; ou de pares de tênis que melhoram a tração e a velocidade de atletas em corridas.
Outro exemplo de tecnologia voltada para a melhora da performance envolve o uso de soluções de realidade virtual em treinamentos com foco na melhora da tomada de decisões, no tempo de jogo de atletas e no próprio condicionamento físico.
É o caso da startup da República Tcheca, Sense Arena, que desenvolveu uma plataforma acessada por meio de óculos de realidade virtual, na qual praticantes de hóquei no gelo, futebol, basquete e outras modalidades, podem ter acesso a diversos módulos de exercício e melhorar suas habilidades esportivas. Até 2024, a expectativa é de que a realidade virtual movimente mais de US$ 44,7 bilhões em investimentos e o segmento de esportes, games e entretenimento deve ser uma das principais alavancas deste mercado, segundo a consultoria Markets and Markets.
Dentro deste cenário, a Sensorial Sports, startup brasileira fundada em 2015, conta que já recebeu financiamento via FAPESP e, atualmente, está incubada no SUPERA Parque, ambiente de inovação de Ribeirão Preto, vem ganhando destaque. Com uma solução focada no fortalecimento da performance cognitiva e checagem do potencial cerebral na rotina de treinos e competições, a startup atende clientes em mais de 25 modalidades e obteve um crescimento de 130% no ano passado.
“Olhando em volta, quase tudo hoje no esporte tem medidas claras. Mas sabemos que, embora as capacidades do atleta em se manter concentrado, atento e em tomar boas decisões sejam essenciais para uma boa performance, os stakeholders no esporte raramente conhecem os estados de seus atletas com relação a estas capacidades. Ainda mais difícil é ter medidas objetivas delas. Por isso utilizamos nossa avaliação de performance cognitiva como primeiro passo. Para auxiliar e promover o desenvolvimento destas capacidades, nós criamos treinamentos específicos para a cognição. Utilizando tecnologias como imersão em realidade virtual, telas touch e mobile, nós testamos e validamos métodos com transferência para a prática esportiva”, explica Milton Ávila, Doutor em Neurociência pela Universidade de São Paulo, CEO e Fundador da Sensorial Sports.
Segundo Ávila, através de estudos controlados, foi possível identificar que os atletas que utilizaram os treinamentos da startup melhoraram indicadores de performance na base de 20%.
Inteligência Artificial para o desenvolvimento de atletas
Para Ávila, outras tecnologias como a IA são uma das principais tendências quando pensamos na performance de atletas. “Neste caso, a aplicação de inteligência artificial sobre um crescente volume de dados, novos métodos de medição e treinamento se apropriando de tecnologias variadas têm guiado os novos caminhos da inovação para a expansão da performance de atletas”, conclui.
Sobre a aplicação de IA no âmbito da performance, vale citar uma matéria da Forbes que ressalta a combinação de IA e analytics para a identificação dos pontos de melhoria de um atleta. Os investimentos em inteligência artificial no mercado esportivo, aliás, devem alcançar 3,3 bilhões até 2026.
Geraldo Campestrini, CEO da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM), acredita que um dos motivadores para o crescimento das novas tecnologias no terreno da performance envolve os impactos positivos que a inovação pode trazer nos processos de preparação para competições.
“Entendemos que a tecnologia é fundamental enquanto ferramenta de suporte para as tomadas de decisão de questões técnicas, táticas e físicas relacionadas ao trabalho de desenvolvimento e alcance de rendimento ideal de atletas de alto nível e em formação. A tecnologia tem um papel importante tanto na competição em si, quanto na preparação para as competições”, comenta.
Na própria CBTM, soluções como o Dartfish (software de vídeo para o treinamento de atletas) são utilizadas para a melhoria da performance de atletas. Um dos desafios para a Confederação, segundo Campestrini, consiste em integrar todas as tecnologias utilizadas pela CBTM e extrair ainda mais benefícios da inovação. Para tanto, a Confederação tem interesse em firmar parcerias com startups, focadas em testes e prototipagem de ferramentas tecnológicas.
“Acreditamos que o nível de maturidade do segmento de Sports Techs é ainda embrionário no Brasil, mas com ótimas perspectivas de crescimento, especialmente no que diz respeito a uma melhor interação com as organizações do esporte, como a própria CBTM”, encerra Campestrini.
Futebol Interativo
A Futebol Interativo é uma startup potiguar que oferece cursos e conteúdo digital focado na capacitação e melhoria das habilidades de técnicos, atletas e gestores de futebol. A startup faz parte do programa de inovação e empreendedorismo do Inova/Instituto Metrópole Digital da UFRN.
NeuroEsporte
A NeuroEsporte utiliza a realidade virtual para desenvolver treinamentos e conta com outra série de equipamentos esportivos em seu portfólio focados em performance e desenvolvimento de habilidades. Conta com atletas profissionais e amadores em sua base de clientes.
Halo Neuroscience
A Halo Neuroscience é uma startup americana de neurotecnologia focada no uso de neuroestimulação elétrica para a melhoria do desempenho de atletas e para tratar doenças. Já recebeu US$ 24,7 milhões em investimentos .
Torq Labs
A Torq Labs desenvolveu uma tecnologia de sensores para identificar movimentos assimétricos em atletas com foco na prevenção de lesões e melhoria da performance de triatletas, corredores e ciclistas. A startup americana fundada em 2016 está sendo acelerada pela Station F.